quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

KOMBUCHA

















Kombucha – 2’17”- Experimental – Bolívia - Brasil – 2009
Direção, fotografia e montagem: Sávio Leite
Música: Pumpy – Mechanics

Um biofilme resultado de uma simbiose complexa entre espécimes de bactérias e leveduras.

A biofilm resulted from a complex symbiosis between bacterias species and yeast.

Seleção:
13a Mostra de Cinema de Tiradentes – MG – 2010 – Brasil
9ª Mostra do Filme Livre – RJ – 2010 – Brasil.
5 FECIS0 - Festival de Cine Social y Antisocial - Santiago - 2010 - Chile
7º EL ESPEJO - Festival Internacional de Cortometrajes y Esculas de Cine – Bogotá – Colômbia – 2010.
IV Mostra Internacional de Curtas Metragens da Unioeste – Toledo – PR - Brasil


algumas consideraçoes:
O LUGAR MAIS SAGRADO DO PLANETA

Toda viagem indica uma transformação. Esta no próprio ato de se deslocar. Mais do que isto, pressupõe a quebra de preconceitos e te proporciona uma forma mais leve de encarar a existência, de viver novas experiências, muitas vezes nascidas de devires que viram a acontecer no improviso, No próprio ato de viver.

O curta KOMBUCHA começa com uma viagem terrestre. De Belo Horizonte no Brasil a Ilha do Sol na Bolívia. A viagem foi feita toda através de ônibus. De Belo Horizonte a São Paulo. De São Paulo para o sul do Brasil, depois cruzando a Argentina até chegar a Santiago no Chile, passando por lugares deslumbrantes na Cordilheira dos Andes.

De Santiago a Iquique, cruzando o deserto de Atacama e cidades mágicas como Tocopylla, cidade natal do inimitável cineasta Alejandro Jodorovsky. De Iquique para Oruru na Bolívia. A viagem para a Bolívia tinha como objetivo conhecer o cineasta, e principalmente os filmes de Jorge Sanjinés.

De Oruru para Cochabamba. Apesar do charme que o nome de Cochabamba evoca, não acostumei com a cidade. Fiquei na casa de dois primos, irmãos, que estudam medicina. Duas noticias me sacudiram em Cochabamba. Primeiro fiquei sabendo que os filmes de Jorge Sanjinés não estavam a venda em lugar nenhum e não poderiam ser assistidos. Terminantemente. Vi outros filmes bolivianos, principalmente Evo Pueblo de Tonchy Antezana, cujo nome verdadeiro é Sérgio. Em Cochambamba andando pelo mercado principal comprei um livro que seria o guia da minha viagem dali por diante: El mensaje secreto de los símbolos de Tiahuanaco y del Lago Titikaka.

Conheci Sérgio Antezana em sua produtora em Cochabamba. Creio que foi uma vista muito peculiar e até hoje nos correspondemos. Sérgio acaba de lançar outro longa “Cemitério de Elefantes”. Uma tarefa árdua já que a Bolivia é um dos países mais pobres e menos desenvolvidos da América Latina. Pobre economicamente porque o país carrega um tesouro arqueológico de mais de 12.000 anos de uma vasta historia e cultura.

A segunda noticia recebi através do MSN do meu sobrinho em Cochabamba informando sobre um acidente com meu único irmão que mora nos EUA. O acidente tinha sido muito grave. Ele já tinha passado por muitas cirurgias e ficaria um bom tempo no hospital.

Com essa noticia resolvi encurtar minha viagem, mesmo conseguindo falar com meu irmão no hospital e ele me tranqüilizando que o risco de morte já tinha passado. Parti para La Paz. Quando cheguei a La Paz reconheci no primeiro passeio pela cidade toda a vida pulsante no meio a muitas cores, cheiros e misturas de pessoas. Mesmo sabendo que o meu intuito era exótico, depois de contactar algumas pessoas que trabalham com cinema na Bolívia, procurei a casa de Jorge Sanjinés. Chegando a sua casa, bati a porta sem resultado.

Resolvi explorar mais um pouco os lugares próximos a La Paz: tomei conhecimento de um passeio a terras do Tihuanaco, um grande sitio arqueológico, composta por um museu e uma cidade que estava aparecendo debaixo das escavações. Algumas habilidades dos Tiahuanaco impressionam como o sistema de áudio e comunicação e suas bela arquitetura. No museu construído ao lado poderiam ver crânios trepanados. Quando os Tiahuanaco percebiam que determinada criança aprendia certas habilidades muito novas, ou mesmo falavam e escreviam antes do tempo, seus cérebros eram expandidos com grandes pregos afim de a massa craniana poder se expandir também. Subimos a um monte onde contava nosso guia que ali era o lugar mais sagrado do planeta e até para ele um típico habitante do lugar, podia sentir as vibrações. Subindo a esse monte tive a certeza que meu irmão dali em diante não morreria e eu poderia ainda curtir o restante da viagem.

Resolvi então conhecer o Lago Titikaka, que há dias povoava a minha imaginação. Uma viagem fantástica. O lago Titicaca é envolvido em muitos mistérios. É um santuário para quem vive de suas águas. A histórica diz que foi um lago desenhado e construído, mas o seu desenho só pode ser visto do espaço: um peixe, um puma e um homem alado. Os separa um cálice telúrico: o vulcão Kjapphia e a cidade encantada de Copacabana. Este desenho considerado “A grande Esfinge Aquática do Titikaka”, são figuras simbólicas que guardam identidade como a ideografia Tiahuanacota. Por esta razão é considerado um lago sagrado. A ilha do sol onde Jorge Sanjinés rodou o seu primeiro filme, UKAMAU localizado em uma das suas margens também é considerado sagrado pela crença popular, pois seria o lugar onde teria aportado a famosa Arca de Noé, que depois se transformou em ouro e prata e depois em pedra. O lago ficaria como prova do maior dilúvio que o Planeta Terra presenciou. Nessa ilha, as pedras parecem pregadas, com desenhos na paisagem que até hoje a geologia não conseguiu explicar completamente. A velha tradição andina dizem que ela é o berço do Império Inca. De toda maneira o Titikaka é considerado o maior lago em altitude do planeta com 8.560 kilometros quadrados, passando pela Bolívia e o Peru. Suas águas exercem o maior facinio por serem tropicais, mas frias. Com uma profundidade de 284 metros é navegável para grandes embarcações. Contém 36 ilhas, sendo a ilha do Sol a mais importante.

De volta a La Paz fui encontrar com um amigo de uma amigo do Brasil, onde tomei na casa dele a Kombucha, um chá, sem propriedades alucinogeneas, mas cujo fabricação remonta há mais de 10.000 anos. Uma bebida de sabor forte e gostosa, mas que me levou para cama no ultimo dia na Bolívia.

Por uma circunstancia do destino fui proibido de embarcar no dia seguinte porque não estava com o meu cartão de vacinação. Nada mal, pois tinha adorado conhecer La Paz. Depois de devidamente vacinado, volto a percorrer as ruas de La Paz andando por caminhos que suspeitava ainda não tivesse caminhado. Não é que parei de novo em frente a casa de Jorge Sanjinés. Não titubiei. Bati na porta e fui atendido pelo seu filho, Mallkus. Expliquei que era brasileiro e que tinha muita curiosidade em conhecer o cinema dele. Para mim surpresa, um grupo de pessoas estava no local e começariam em seguida a ver um filme dele. Pedia com humildade para também assistir. Mallkus foi sondar o grupo e voltou com a resposta afirmativa.

O filme que assitimos foi: El coraje del pueblo, um filme de 1971. Uma verdadeira obra de arte, que deixou a pequena audiência sem palavras. O curta Kombucha é uma homenagem a todos esses eventos extraordinários acontecidos em uma viagem. Acabei comprando um livro chamado: Teoria y práctica de um cine junto al pueblo escrito pelo próprio Jorge Sanjinés y Grupo Ukamau. Toda a cinematografia de Jorge Sanjinés é em prol da preservação da população aymara e falado em quéchua.

Sávio Leite – Janeiro de 2010.